Medida financiada no âmbito do Plano de Promoção da Eficiência no Consumo de Energia, aprovado pelo ERSE - Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos.
Alimentação e alterações climáticas: qual é a relação?
Os sistemas alimentares - desde o cultivo e uso de fertilizantes ao armazenamento, transporte e gestão de resíduos – são responsáveis por quase um terço das emissões mundiais de gases com efeito de estufa.
O que comemos e a forma como esses alimentos são produzidos afetam não só a nossa saúde, mas também o ambiente.
Antes de chegarem aos nossos pratos, alguns alimentos têm de ser cultivados, transformados, transportados, distribuídos, preparados e, caso haja desperdício, ainda têm de ser eliminados.
Ora, cada uma destas etapas gera gases com efeito de estufa (GEE) que retêm mais calor na atmosfera, provocando o aquecimento global. Como consequência, as alterações climáticas põem em causa a segurança alimentar, especialmente nos países em desenvolvimento.
Cerca de um terço de todas as emissões de GEE provocadas pelo Homem está relacionado com a alimentação. Em Portugal, só o consumo alimentar representa 32% da pegada ecológica nacional, mais do que o setor dos transportes e mobilidade (que contribui com cerca de 18%), segundo a Associação Zero.
O que acontece aos alimentos antes de os consumirmos?
Os sistemas alimentares globais abrangem todo o processo desde o cultivo do alimento à gestão dos resíduos causados pelo seu desperdício. Isto inclui a agricultura e a utilização dos solos, a produção pecuária, o consumo e o desperdício de alimentos domésticos e a energia utilizada nos setores agrícola e retalhista de alimentos (muitas vezes esta energia provém dos combustíveis fósseis).
A maior parte dos GEE relacionados com a alimentação são libertados durante a primeira fase - a agricultura e utilização dos solos.
Já a refrigeração e transporte de alimentos, os processos industriais (como a produção de materiais para embalagens) e a gestão dos resíduos alimentares têm um peso menor nas emissões.
Qual é o impacto do desperdício alimentar?
Segundo a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), cerca de 1/3 de todos os alimentos produzidos no mundo são perdidos ou desperdiçados em alguma fase da cadeia de abastecimento alimentar - e a maior parte é desperdiçada em nossas casas. De todas as emissões do sistema alimentar global, o desperdício alimentar é responsável por metade, segundo um estudo de 2023.
Quando deitamos fora os alimentos, estamos a desperdiçar a energia, a terra, a água e os fertilizantes que foram utilizados para os produzir, embalar e transportar. No fundo, se o desperdício alimentar fosse um país, seria o terceiro país do mundo com mais emissões de GEE, ficando apenas atrás da China e dos EUA.
Quais são os alimentos com mais emissões?
Em geral, os alimentos de origem animal, como por exemplo as carnes vermelhas (vaca, porco, cabrito, entre outras) e os laticínios (leite, queijo, iogurtes, manteiga, por exemplo) precisam de mais terra, energia e água para serem produzidos, por isso, têm um maior impacto climático.
Isto deve-se ao facto de:
Serem precisos terrenos extensivos, muitas vezes criados através do abate de árvores (desflorestação), o que causa a libertação do dióxido de carbono (CO2) armazenado nas florestas e a destruição de habitats;
As vacas e as ovelhas emitirem metano à medida que digerem a erva e as plantas;
Os dejetos do gado nas pastagens e os fertilizantes químicos utilizados nas culturas destinadas à alimentação do gado emitirem óxido nitroso;
Ocorrerem outras emissões provenientes da gestão do estrume, da queima de resíduos de culturas e da utilização de combustíveis nas explorações agrícolas (nos tratores e outras máquinas agrícolas, por exemplo).
Por outro lado, os alimentos à base de plantas - como frutas e legumes, cereais integrais, feijões, ervilhas, nozes e lentilhas - utilizam geralmente menos energia, terra e água e não emitem tantos gases com efeito de estufa.
A transição para dietas de base vegetal beneficiaria não só o planeta (uma alimentação vegan pode reduzir a pegada de carbono até 73%), a qualidade da água e a biodiversidade, mas também a saúde humana, contribuindo para o combate de doenças crónicas.
Segundo o relatório “Proteína Verde: Plantar a Alimentação do Futuro”, 1 kg de bife de vaca, produzida em Portugal, em modo intensivo, emite cerca de 80 kg de CO2eq (medida que representa a quantidade de GEEs em termos equivalentes da quantidade de CO2), o equivalente a uma viagem de 230 km de carro. Comparativamente, a produção de 1 kg de feijão gera apenas 1 kg de CO2eq, ou seja, o bife de vaca contribui 80 vezes mais para estas emissões.
Como podemos mudar o paradigma?
Como é que as emissões relacionadas com os alimentos podem ser reduzidas? Uma vez que todas as etapas contribuem de alguma forma para as emissões, é necessário fazer mudanças em todas as fases, desde o produtor ao consumidor.
Na produção
Para alcançar uma produção alimentar com baixas emissões de carbono e resistente às alterações climáticas, como a prevista pelas Nações Unidas, não se pode apenas exigir que os agricultores e criadores de gado deixem de usar fertilizantes químicos ou alterem a dieta dos animais para melhorar a sua digestão - é preciso ajudá-los a adaptarem-se a um novo sistema alimentar, mais sustentável e justo para todos.
Isso significa não só sensibilizar os agricultores, mas também prestar apoio durante a transição para proteger os meios de subsistência. Os governos devem fornecer o financiamento, as infraestruturas e a tecnologia necessárias para se adaptarem às condições meteorológicas extremas, cada vez mais frequentes, e adotarem práticas mais ecológicas.
Este apoio é ainda mais importante nos países pobres, que atualmente precisam de recorrer a fertilizantes e outros produtos químicos para melhorar os baixos rendimentos das suas culturas.
Na dieta
Enquanto consumidores, podemos fazer a nossa parte ao consumir menos carnes vermelhas e laticínios e mais proteínas vegetais (como feijão, grão-de-bico, lentilhas, nozes e grãos).
Isso não significa que a carne deve desaparecer completamente da dieta ou que te deves tornar 100% vegan. Podes simplesmente comer menos alimentos associados a uma maior pegada de carbono e preferir proteína vegetal e alternativas à base de plantas (como tofu e seitan, no caso da alternativa à carne, ou leite de soja, no caso dos laticínios).
De acordo com uma investigação recente, comer menos carne equivale a tirar 8 milhões de carros da estrada.
Na sazonalidade dos produtos
Nas prateleiras dos supermercados, habituámo-nos a encontrar toda uma variedade de frutas e legumes durante todo o ano.
Apesar do transporte representar uma parcela menor na pegada climática total dos alimentos, escolher alimentos locais e da época ajuda a reduzir o impacto que temos no planeta. Ao escolheres um produto sazonal e/ou local, não estás a comprar algo que foi produzido do outro lado do mundo e transportado de avião ou barco até ti, mas sim a ajudar os produtores locais e a respeitar a sazonalidade dos alimentos. Estes alimentos trazem ainda benefícios para a saúde humana, pois são mais ricos em nutrientes.
No desperdício
Também é essencial reduzir o desperdício alimentar em casa. Neste caso, podes fazer a tua parte ao:
Comprar apenas o que precisas;
Planear as refeições;
Congelar as sobras para comeres mais tarde;
Escolher frutas e legumes “imperfeitos” (as lojas podem deitá-las fora);
Fazer compostagem, se tiveres de deitar fora os alimentos.
Qual vai ser o teu primeiro passo rumo a uma alimentação mais amiga do ambiente?